sexta-feira, 31 de outubro de 2008

conto


Quinze de agosto, meu avô faria cento e vinte e seis anos e meu amigo gonçalo faz cinqüenta। Você me acha por e-mail. Eu fico nervoso com as louras, se for linda então complica mais. Chego na plataforma do metrô e uma loura do perfil dela me olha de longe, vou na direção como se fosse, mas não falo nada, fico na sua frente, os dois desconcertados. Tenho vontade de falar não consigo. As portas se abrem deixo todos entrarem e ocuparem os assentos. Fico de pé em frente. Chega um senhor de muletas, ela oferece e ele recusa. Na próxima parada a pessoa do lado dela desce. Vou e também pergunto se ele não quer sentar, recusa. Sento. Ela está, como eu, mexida, pega o celular e pluga o som, bate os pés no chão ao ritmo da música. Catete station, diz a locutora, locutora ou loucutora? Não sei o que fazer. Minha vida de sedutor está chegando ao fim e não sei o que faço com isso. Não estou acostumado. Glória station. A minha vida agora parece que vai ser um romance e o que disse para uma amiga parece que vai acontecer comigo: “voce agora vai viver um grande amor”. Mas eu estava falando dela. Decido que vou deixar ela descer. Carioca station. Talvez o medo da lourice seja da minha mãe, não sei. Ela, o meu amor, é a minha mãe loura. Será? Mas como eu vou deixar uma mulher linda passar sem fazer nada? Escrevo isso tudo enquanto penso, num caderno azul tibetano. Talvez esteja escrevendo para lidar com essa situação, para a ficção se separar da realidade. Mas isso é realidade ou ficção? Poder lidar com essa situação estranha, da mesma forma que ela está fazendo com o celular, ouvindo musica, disfarçando. Como lidar com essa situação de amor, de sedução, de atração, enfim dessa distância entre o masculino e o feminino. Estou com fome. Nunca se imagina que vamos ficar tanto tempo junto de uma pessoa, como esta, com uma mulher linda ao meu lado, que ouve música, enrola o cabelo louro com os dedos esquerdos. Eu sou escritor. Posso pegar o e-mail dela e mandar o que estou escrevendo. Ensaio, ensaio e não sai. Será que me volto para cá ou para vitória. Não há dúvida, vitória é presença. Chega a minha estação, desço triste, nervoso, agitado, faminto.15 de agosto de 2008
a ilustração é uma fotografia de márcia monteiro.